quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Desafio e êxito de Anne Sullivan









“Que as necessidades do corpo dela sejam os meios de fazer com que aprenda”. A partir dessa premissa a professora Anne Sullivan encara a árdua e difícil tarefa de ensinar uma garota, Helen Keller , de 7 anos de idade, cega e surda, a se comunicar com o mundo. Essa é a história real retratada no filme O Milagre de Anne Sullivan.

O filme foi produzido no início da década de 60 e é contextualizado no final do século XIX, no Alabama – EUA. Seu diretor, Arthur Penn, consegue empregar um caráter brilhante e ao mesmo tempo angustiante a todo o enredo, que contou com a incrível performance das protagonistas Anne Bancroft e Patty Duke, nos papeis respectivamente de Anne Sullivan e Helen Keller. Interpretações incríveis que cederam um Oscar para cada uma.  O roteiro foi baseado da peça de William Gibson, inspirada na autobiografia que Helen publicou aos 22 anos.

Helen nasceu perfeita e aos 19 meses de idade contraiu uma doença que a deixou com cegueira e surdez. Na época foi diagnosticada como febre cerebral, hoje se presume que ela teve escarlatina ou meningite. A primeira cena do filme retrata o desespero da mãe de Helen, Kate Keller (Inga Swenson) ao perceber que a filha não responde aos seus movimentos e sons.  Com o passar dos anos, os transtornos e dificuldades com a situação da garota levam seu pai, Arthur Keller (Victor Jory) a cogitar mandá-la para um orfanato. Porém, por intervenção da esposa, Arthur solicita a vinda de uma professora de um instituto especializado e é dessa maneira que Anne Sullivan entra na vida de Helen.  

Anne se identifica de imediato com o drama da garota, em algumas cenas o telespectador é transportado para a infância da professora que também teve cegueira quando criança. Interessante ressaltar a fotografia dessas cenas visto que nos remetem à visão embaçada de Anne da época, lembranças turvas de uma infância triste e de desprezo.

O roteiro todo se baseia em cenas do cotidiano de Helen e suas posturas nas mais diversas situações. Quanto à abordagem de Anne, percebe-se um aspecto condicionante em sua pedagogia ao recompensar Helen por cada palavra que ela consegue sinalizar com a mão, ao controlar o espaço e até a comida da garota. A seguinte fala de Anne retrata bem essa metodologia: “Quero cuidar dela dia e noite. É necessário que ela dependa totalmente de mim... A comida que come, as roupas que veste, o ar que respira. (...). A professora dela e não um parente deve controlar isso.”

A cena mais forte, exaustiva e até um tanto violenta, se passa num jantar da família no qual Helen percorre a mesa se servindo dos pratos dos presentes e comendo a comida com as mãos, sem nenhuma restrição e com a conivência geral de todos. Anne se recusa a permitir essa postura, solicita que todos se retirem e se tranca com Helen na sala de jantar. A partir desse momento é travada uma “batalha” exaustiva entre as duas, Anne, através de um tremendo esforço físico, tenta forçar Helen a sentar à mesa e a comer com uma colher e esta resiste até suas forças esgotarem.

Essa abordagem comportamentalista é muito característica do contexto educacional norte americano e não deixa de ser uma estratégia repugnante para as linhas mais avançadas da pedagogia contemporânea, entretanto, é impossível desconsiderar o referido contexto histórico do drama, como também, o contexto familiar problemático de Helen. 

Um dos aspectos que o diretor Arthur Penn conseguiu transmitir com fidelidade refere-se ao fato de que muito mais do que uma ausência de regras de comportamento, a vida de Helen é abordada com um descaso inconsciente pela família, que sem a mínima noção de como educá-la cedem a todos os seus desejos e caprichos para não vê-la “sofrer”. Como afirma a personagem Anne em uma de suas falas no filme: “Eu não acredito que o pior problema de Helen seja a surdez ou a cegueira. Eu acredito que seja o amor e a piedade de vocês. Vocês têm tanta pena dela que a criaram como uma mascote.”

Apesar dos métodos nada avançados, é importante ressaltar o profundo amor que Anne sente por Helen. A professora se importa realmente com o aprendizado da aluna, sua intenção não se limita a fazer com que Helen simplesmente decore sinais, mas que consiga estabelecer uma comunicação verdadeira com o mundo e com as pessoas que a cercam, que ela tenha a necessidade de interagir e ter curiosidade para apreender o que não consegue captar pelos olhos e ouvidos. E é apoiada nessa intenção, nesse amor, que Anne Sullivan consegue seu “milagre”, Helen desperta para o mundo e para as possibilidades de interação com ele.

Apesar de não ser retratado no filme, o elo entre professora e aluna perdura por 49 anos. Anne acompanhou Helen até sua morte. Helen tornou-se escritora, conferencista e ativista política, junto com Anne, fundou instituições em prol dos cegos e é lembrada no mundo inteiro como defensora dos portadores de deficiência.

O Milagre de Anne Sullivan, não é só uma incrível história real de superação, é um filme que além de nos emocionar, nos provoca, nos inquieta para a reflexão da difícil tarefa da educação especial, como também, para o poder de transformação que um educador tem na vida de um educando.

Por Danielle Morais Feitosa

Referências:

O MILAGRE DE ANNE SULIVAN. Título original: The Miracle Worker. Direção: Arthur Penn. Produção: Fred Coe. Elenco: Anne Bancroft, Patty Duke, Victor Jory, Inga Swenson, Andrew Prine e outros. Roteiro: baseado em peça teatral de William Gibson. EUA: Playfilm Productions, 1962. DVD (107 min), son, peb.



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